quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Os bares em Belém acabam na quarta-feira...


O bar nosso de cada dia...

Em janeiro de 2009 o nosso eterno amigo Juvêncio de Arruda alertava que o boteco do Ranulfo ia acabar, a gente escutava a estória mas não acreditava, sabe aquele papo de fim-do-mundo segundo os Maias? Pois é, era por aí o negócio.

Em 4 de abril de 2009 tivemos a despedida, um bota-fora memorável, com direito a tudo, incluindo até camisa de despedida (serigrafada pelo Reco), o boteco ficou entupido de gente lacrimosa, rolou o melhor que o nosso pé-sujo poderia produzir, tira-gosto e cerveja estupidamente gelada...

Naquele dia estávamos alegres, e como diria Maiakóvski "e por que razão haveríamos de ficar tristes? O mar da história é agitado...", realmente foi um dia de muita agitação e alegria.

O nome do boteco sempre achei estranho - Vital Drink's, depois de muito tempo fiquei sabendo que o nome do Ranulfo era "Ranulfo Vital", tá explicado, né?

A festa de despedida se eternizou...

O mais entusiasta daquela festa fez a sua despedida de verdade - Juvêncio Arruda (Juca), alguns meses após a festa o Juca faleceu deixando um vazio entre nós.

O prédio em que funciona o boteco do Ranulfo foi vendido em 2009 para uma construtora, fizemos a festa de despedida, mas o boteco não fechou, tudo porque a construtora ficou sem grana para iniciar a construção do prédio residencial, e aí?

O Ranulfo foi se fingindo de morto e foi ficando, ficando...

Ontem recebi um telefonema no final da tarde, a pessoa nem se identificou e foi logo falando com a voz embargada: - Olha mermão! O boteco vai fechar hoje, a defesa civil condenou o prédio do lado que pode desabar sobre o boteco.

Fiquei assustado e retruquei pesaroso: - É o Ranulfo?!

Ele me respondeu como o próprio ministro da educação: - Não, é o Papa!

Era mesmo o Ranulfo, aquele homem de uma delicadeza de pugilista de rua, que no primeiro momento fere a sensibilidade dos desavisados, para depois com o convívio se revelar uma moça no trato com os amigos.

Depois que ele desligou, por alguns momentos fiquei relembrando o quanto aquele pé-sujo e o seu dono fizeram parte da minha vida, o pé-sujo é uma instituição nacional, a alma brasileira pulsa a sua verdade nas mesas dos botecos, e os donos desses lugares lidam com todo tipo de gente, vai do doutor ao peão, convívio democrático, todos ali de sandália de dedo, camiseta e bermuda, soltando o palavrão livremente, nada de censura...

O título da postagem foi surrupiado do jornalista Elias Pinto.

Cabe uma sombria observação, Elias Pinto há dois anos escreveu um artigo para o jornal "Diário do Pará", o título do artigo era "Os bares em Belém acabam na quarta-feira", ele ficou só de bubuia esperando o desfecho do bar do Ranulfo, e não é que o boteco acabou na quarta-feira?!

Elias Pinto se vivesse na Grécia antiga ele desempregaria as pitonisas do templo de Delfos, fácil fácil.

O boteco acabou ontem.

Fui lá e encontrei com outras testemunhas do evento que virou história: Rui Baiano, Bruno Cabeção, Professor Gláucio e mais um anônimo, éramos poucos para muita emoção.

A cerveja sempre bem gelada.

O meu último tira-gosto era também a última porção de pirarucu, não havia mais cozinheiras, todas dispensadas com todos os direitos trabalhistas pagos, o Ranulfo foi para a cozinha e fez o melhor e mais delicioso pirarucu que já comi em toda a minha vida.

O Cabeção quis chorar, mas alguém em cima falou, parafraseando Adoniram Barbosa, "os homi tão com a razão nós arranja outro lugar", era muita emoção pra pouca gente.

É importante dizer que com o fechamento do boteco do Ranulfo (botafoguense e bicolor), muita gente vai perder o seu psicanalista, "adivinho", curandeiro, analista político, economista, engenheiro... O Ranulfo era vários num só, muito melhor que o Guido Mantega, Mãe Delamare não era páreo pra ele, as pessoas contavam os sonhos que tiveram para o Ranulfo, ele interpretava cientificamente e dizia qual o bicho no jogo de azar.

Ah! Por falar em interpretação de sonhos, uma vez ele me contou que um cara quis sacanear com ele, pediu uma cerveja e disse: - Ranulfo eu sonhei contigo, qual o bicho eu jogo?

Ele respondeu olhando firme nos olhos do cliente engraçadinho: - Viado!

O cara riu e sapecou: - Eu sabia!

O Ranulfo complementou: - Só pode ser viado, porque eu sou um cara feio pracaralho, um cabra sonhando comigo, só pode ser viado!

Depois dessa resposta o cliente ficou em silêncio, sem jeito pagou a cerveja e foi embora.

Pô Ranulfo! Vou ficar com saudades de ti, mermão.

Para encerrar, estou desarmado e sem quartel...

Deixo a pergunta feita por Neruda aos notívagos:

"É verdade que a esperança

se deve regar com orvalho?" (Pablo Neruda)


3 comentários:

Anônimo disse...

DOMINGO (22.01) é Dia Nacional Contra a crueldade com animais.
Ananindeua vai participar, concentração na Praça Tancredo Neves, Bairro do Coqueiro, Cidade Nova 4.
Em Belém a manifestação será na Praça da República, em frente ao Hilton Hotel

Anônimo disse...

Mais informações no link www.crueldadenuncamais.com.br

Pedro Nelito Jr disse...

Anônimos,
Nada de crueldade...
Beijos