terça-feira, 25 de outubro de 2011

Politização do Judiciário

Vale debater sobre a politização do judiciário, como por exemplo a manifestação de Gilmar Mendes quando era Presidente do STF, numa tentativa dele de criminalizar os movimentos sociais...

O Professor de direito da UFPA - Paulo Weyl  problematizou na época essa manifestação.

O texto de Paulo Weyl em que ele expõe a sua preocupação sobre a manifestação do Ministro Gilmar é anterior à eleição de 2010, de certa forma didático sobre a atuação política da mais alta corte de justiça do país, vamos prestar atenção no que escreve o Paulo Weyl, ok?!

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 "Penso que temos um debate aberto, uma boa chance para discutirmos um pouco mais essa coisa do direito e das instituições. O Presidente do Poder Judiciário, em face das ações promovidas por militantes direta ou indiretamente ligados ao MST, que resultaram em homicídio em Pernambuco e nas já famosas ocupações no Pontal de Paranapanema, em São Paulo, pronunciou-se no sentido de condenar o MST e os hipotéticos financiamentos públicos ao MST levados a efeito pela administração pública federal (e algumas estaduais, certamente ligadas ao PT). 

O pronunciamento é impactante. Antes do mais por se tratar do representante máximo do Poder Judiciário, um dos pilares do Estado Moderno, responsável, pelo menos em tese, pela garantia da ordem e da segurança jurídicas. É impactante também porque em parte o STF vem cumprindo esse papel, quando considerado a formalidade processual e em alguns casos o direito material em questão. Outra circunstância importante é a dimensão pública dos acontecimentos decorrentes da ação da militância direta ou indiretamente ligado ao Movimento dos Sem Terra. 

A sociedade política brasileira não tolera a intolerância (por vezes os leitores não toleram os trocadilhos!). As ações que resultaram em homicídios em Pernambuco, ao juízo público, equivalem à mesma intolerância que provocaram, e infelizmente ainda provocam, assassinatos de trabalhadores sem terra, de sindicalistas, de religiosos, de militantes políticos. O Estado do Pará é marcado por essas tragédias, para as quais tem concorrido empresários rurais, latifundiários, particulares, muitas vezes com o apoio de Instituições Estatais, pela ação direta das instituições de segurança pública, que têm por fim zelar pela segurança da cidadania. Todavia, seria por essa razão lamentável condenar todo empresariado rural e mesmo o Estado. 

Esse julgamento por analogia, sabem os que manuseiam minimamente as regras da interpretação jurídica, e ainda mais os experts, não tem lugar na racionalidade jurídica. (Todavia, o jurídico não é sempre exclusivamente o monumento da racionalidade a que se pretende). Não podemos esquecer, também, da conjuntura política da denominada "antecipação das eleições de 2010". Essa invencionice midiática que pretende ampliar um conceito jurídico eleitoral para imobilizar ações de natureza política visando a inviabilizar possíveis repercussões do largo apoio popular do governo Lula nas eleições de 2010. Não há, não pode haver e é ilícito que haja antecipação do calendário eleitoral. 

Por esse motivo que a mídia "antecipa" o calendário eleitoral, para depois denunciar que o calendário eleitoral fora antecipado. É o que se pode chamar de ficcionismo: uma ficção criada por eles mesmos. É um jogo complexo, todavia. Difícil de "colar". Mas, como anteciparam o calendário, é preciso impacto político nas declarações negativas ao Governo Federal. E isso só pode ser obtido, em tese, por interlocutores com posição estratégica institucional e aparentemente neutral, como é o caso do Poder Judiciário. 

O Presidente do Poder Judiciário, um quadro político forjado no cume de nosso neoliberalismo tupiniquim, sabe do que fala, como fala e quando fala! Mas é importante que se denuncie o caráter político dessas declarações. E por que político? Porque a rigor a declaração jurídica em tese é injusta.

Para se ter uma idéia do que ora afirmamos: em tese, pode ser perceptível à opinião pública que as ações do banqueiro Daniel Dantas não são propriamente ajustadas aos valores jurídicos que conformam um ordenamento justo e democrático. O Presidente do STF, que cuidou por duas vezes para que o banqueiro Daniel Dantas não sofresse o constrangimento da prisão, todavia, não decidiu pela liberdade do Banqueiro em um juízo em tese. 

Tecnicamente analisou o caso concreto e por esse motivo, tão alta decisão, mesmo contestada internamente a partir de posições estratégicas do sistema judiciário, são decisões respeitáveis e têm eficácia decisional. 

Mas o que é uma opinião em tese em relação ao MST? 

É uma decisão judicial?

Ou é uma ação política? 

E o que é uma ação política de um alto dirigente judicial, do Presidente da mais alta corte de justiça do País? 

Do presidente do Poder Judiciário? 

Nada mais é do que apenas isso, uma opinião política! 

Não é sustentável a idéia de que o Presidente do Judiciário é impedido de fazer política. Mas o que se espera do Presidente do Sistema Judiciária é a ação política institucional, viabilizando o aperfeiçoamento do sistema. Seria político, por exemplo, uma ação visando a dinamizar e otimizar as respostas do judiciário frente aos graves problemas agrários do País, muitas vezes matrizes de muitos conflitos. 

Seria vital à cidadania uma política judiciária que conseguisse articular OAB, Faculdades de Direito, Pastorais Carcerárias, e outras instituições da Sociedade Civil e do Estado para dar fim às lamentáveis prisões provisórias permanentes. Seria da maior importância à sociedade brasileira uma política do sistema judiciário para enfim compreender positivamente e programaticamente o direito fundamental à razoável duração do processo e responder aos anseios da Sociedade por justiça. Isso seria política. Essa é a política que todos esperamos do Sistema Judiciário. 

No caso específico da opinião pública do Presidente do Sistema Judiciário, não há que se falar em política institucional. Mas, essa má política tem um espetacular efeito imaginário, para dentro do poder judiciário, forjando pré-compreensões dos agentes desse poder, e para fora do poder judiciário, passar a falsa idéia de um juízo de justiça, criando um sentimento na sociedade política. Pesos e medidas diferentes, infelizmente, lamentavelmente, eticamente reprováveis e em prejuízo incalculável até mesmo a alguns aspectos de importantes políticas públicas conduzidas pela administração pública em várias esferas. 

Afinal, as cooperativas incentivadas pelo Movimento têm o direito de obter do poder público financiamento para o Plantio? 

A colheita? 

A aquisição de bens? 

Mesmo que eventualmente parte de seus integrantes, ou a totalidade destes seja simpática ao MST. 

Aliás, pode a simpatia a um movimento político ser critério material para a inclusão em política de financiamento público, da grandeza e extensão que é o PRONAF, por exemplo? 

É certo dizer que o MST foi o beneficiário do financiamento informado pela mídia? 

E a carona do Presidente do Poder Judiciário nas informações midiáticas?

É um debate importante. Certamente não podemos creditar financiamento público à atividades ilegais. Mas com mais certeza ainda, não podemos julgar como ilegais as atividades dos sem-terra, de suas cooperativas, dos movimentos a ele articulados. 

Aliás, se assim o fosse, o Presidente do Poder Judiciário deveria dar o mesmo descrédito às atividades ilegais do latifúndio, do sistema financeiro, de agentes deste setor conhecidos publicamente. Mas, o que vemos, para estes, é o benefício do devido processo legal, um instituto valioso do direito, o mesmo instituto que queremos e exigimos que seja estendido a todos, efetivando o valor maior da equidade, da igualdade de direitos, da democracia, dos direitos humanos, da dignidade humana...... 

O juízo do direito é o fim de toda racionalidade jurídica, para buscar ao máximo a distância de todo o preconceito."
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Prof. Dr. Paulo Weyl Coordenador do Programa de Pós Graduação em Direito da UFPa. Advogado

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